segunda-feira, 1 de março de 2010

As Cidades Invisíveis

 

Ítalo Calvino foi dica do Judeu, que me emprestou primeiro 'O Cavaleiro Inexistente' e depois 'Se um Viajante Numa Noite de Inverno'. O primeiro me lembrou 'O Incrível Exército de Brancaleone': comédia medieval italiana totalmente debochada. O último é uma pira das mais loucas, um romance 'em segunda pessoa' no qual o personagem principal é o próprio leitor. O início do livro é espetacular (quando forem numa livraria leiam a primeira parte!), depois eu achei que perdeu o pique comparado com o início e nem li até o final.

Acabei comprando depois de um tempo 'As Cidades Invisíveis', que eu já tinha ouvido falar por causa de alguns professores da arquitetura. A 'história' do livro é o viajante Marco Polo descrevendo a Kublai Kahn as cidades do império conquistado por ele. Na verdade, o livro consiste de pequenos textos - cada um sobre uma cidade - entremeados com alguns trechos dos diálogos entre o veneziano e o mongol. As cidades são fantásticas e envolvem diversas simbologias e alegorias muito boas. É um livro de prosa quase poético, e o que eu mais gostei do Calvino até agora.

Depois de marchar por sete dias através das matas, quem vai a Bauci não percebe que já chegou. As finas andas que se elevam do solo a grande distância uma da outra e que se perdem acima das nuvens sustentam a cidade. Sobe-se por escadas. Os habitantes raramente são vistos em terra: têm todo o necessário lá em cima e preferem não descer. Nenhuma parte da cidade toca o solo exceto as longas pernas de flamingo nas quais ela se apóia, e, nos dias luminosos, uma sombra diáfana e angulosa que se reflete na folhagem.
Há três hipóteses a respeitos dos habitantes de Bauci: que odeiam a terra; que a respeitam a ponto de evitar qualquer contato; que a amam da forma como era antes de existirem e com binóculos e telescópios apontados para a baixo não se cansam de examiná-la, folha por folha, pedra por pedra, formiga por formiga, contemplando, fascinados, a própria ausência.

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